A cidade de Brasília completa 50 anos nesta quarta-feira como o principal símbolo do imaginário político brasileiro na atualidade, avaliam especialistas ouvidos pela BBC Brasil.
O sucesso da transferência da administração do Rio de Janeiro para o interior do país, que à época chegou a ser visto com descrédito, hoje já não é mais contestado.
"Sob esse ponto de vista, podemos dizer que Brasília deu certo, sem sombra de dúvidas", diz o sociólogo Brasilmar Nunes Ferreira, professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), que durante mais de 35 anos fez da cidade sua moradia e seu objeto de estudo.
Segundo ele, Brasília não apenas se transformou em uma capital política – "na prática e no imaginário" – como também "cumpriu" o papel de contribuir para o desenvolvimento do interior do país.
"Pode-se dizer que esse objetivo maior foi cumprido. Ou seja, do ponto de vista político, Brasília correspondeu às expectativas", diz Ferreira.
Projeto
Já do ponto de vista urbanístico, Brasília desperta as mais variadas avaliações entre os especialistas.
Os grandes espaços vazios, os prédios padronizados e as quadras numeradas são apenas algumas das características do projeto de Lúcio Costa que costumam colocar urbanistas em lados opostos.
Brasília em números
População: 2,455 milhões de habitantes
PIB: R$ 99,9 bilhões (2007)
PIB per capita: R$ 40,6 mil (2007)
Renda média mensal: R$ 2,6 mil (2007)
Analfabetismo: 4% (2009)
Índice de GINI (desigualdade): 0,618
Pobreza: 37,7% (2003)
Taxa de uso do telefone celular: 75,6% das pessoas (2008)
Crianças fora da creche ou escola: 21,97% (2006)
Os mais críticos argumentam, por exemplo, que o projeto foi "ingênuo" por não ter previsto o crescimento populacional e urbano com base em uma expansão que já vinha ocorrendo em outras grandes cidades do mundo.
Para o arquiteto José Galbinski, da Universidade de Brasília (UnB), Brasília deve ser analisada no "contexto histórico" em que foi criada, e não com as informações de que dispomos hoje.
"Quando Lúcio Costa apresentou seu plano, os automóveis eram importados e pouquíssimas pessoas tinham um. Não é à toa que as quadras têm poucos estacionamentos", diz.
O desafio, na avaliação de Galbinski, é respeitar Brasília como um projeto histórico, mas ao mesmo tempo criar mecanismos que atenuem os problemas da vida moderna.
"Desenvolver as cidades satélites, investir em transporte público e permitir prédios mais altos em regiões como Sudoeste e Noroeste seriam algumas saídas", diz.
Desigualdade
A Brasília que se popularizou como centro dos acontecimentos políticos e principal exemplo de planejamento urbano do país muitas vezes acaba por esconder outras faces.
Uma delas é a da riqueza. Na média, o morador do Distrito Federal é o mais rico do país, na comparação com outros Estados da federação. Seu salário é o dobro da média nacional (R$ 2,6 mil), segundo dados do IBGE referentes a 2007.
O Produto Interno Bruto per capita da região – número próximo ao conceito de renda – também é o maior do país: em 2007, esse valor era de R$ 40 mil, o triplo do restante do Brasil e quase o dobro do registrado no Estado de São Paulo.
Essa renda, porém, é extremamente mal distribuída. De acordo com o IBGE, o Distrito Federal é a unidade da federação mais desigual do país.
Galbinski diz que o próprio desenho da capital – segundo ele, "uma ilha cercada por satélites" – resultou em um alto índice de segregação.
"A segregação em Brasília é integral. Ela ocorre no espaço físico, na questão cultural, na saúde", diz o arquiteto.
Segundo ele, o resultado é um "pequeno pedaço" muito rico, representado pelo Plano Piloto, e o restante da região, "geralmente segregado e esquecido".
"Muita gente chega a pensar que Brasília é só o Plano Piloto. Na verdade, Brasília é todo esse conjunto, enquanto o Plano é uma pequeníssima fração", diz.
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