sábado, 6 de fevereiro de 2010

Empresa é condenada a pagar R$ 70 mil por falha

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A empresa de ônibus tem o dever de prestar um serviço eficiente e adequado e possui a liberdade de escolher a forma como isso será feito. “Porém, em hipótese alguma pode compelir o usuário a utilizar o veículo mais luxuoso, de tarifa mais cara, com a excessiva demora dos ônibus urbanos, que custam pouco mais da metade.” O entendimento é da juíza Mirella Letizia Vizzini, da 5ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, que condenou a Auto Viação Jabour Ltda. a pagar R$ 70 mil de indenização por danos morais coletivos. Cabe recurso.

De acordo com a juíza, a empresa trabalha com 15 veículos, conforme determinação da Secretaria Municipal de Transportes. Dez veículos são rodoviários e a tarifa promocional custa R$ 7; cinco são coletivos urbanos, e a passagem custa R$ 4,20. “Não é preciso ser engenheiro de tráfego ou grande matemático para se perceber que se dois terços da frota dão de ônibus especiais (passagem no valor promocional de R$ 7) e apenas um terço é de ônibus urbanos de tarifa mais econômica, o passageiro que deseja viajar pagando menos vai esperar mais que o razoável o ônibus mais barato”, constatou.

Para a juíza, houve dano moral porque a empresa se omitiu da obrigação de prestar serviço de forma organizada e adequada e de prestar aos passageiros informações claras sobre os horários e o tipo de ônibus de determinado horário, o que evitaria superlotação, esperas excessivas e o pagamento de tarifas mais altas.

A ação foi movida pelo Ministério Público do Rio contra a empresa. O argumento foi o de que os consumidores estavam sendo prejudicados. Além de indenização, o MP pediu que a empresa fosse obrigada a prestar o serviço com regularidade, obedecendo a intervalos de 15 minutos; registro, em escala própria, da numeração de cada coletivo, horário de saída e nome completo do motorista. A juíza julgou procedentes esses pedidos.

O promotor de Justiça, Rodrigo Terra, classificou as medidas como essenciais. Segundo ele, a empresa vinha substituindo os coletivos convencionais com ar-condicionado da linha 1.132 (Castelo-Campo Grande), por outros de modelo diferente com tarifa mais cara. Além disso, os mais de 30 minutos de intervalo entre um e outro coletivo geravam superlotação. Com informações da Assessoria de Imprensa do MP-RJ.

Leia a decisão:

Trata-se de Ação Civil Coletiva com pedido de antecipação dos efeitos da Tutela proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, na qual alega, em resumo, que a empresa Ré permissionária da exploração da linha nº 1132, com itinerário Castelo/Campo Grande, vem prestando serviço inadequado de transporte coletivo, uma vez que vem substituindo os coletivos convencionais com ar-condicionado de tarifa R$4,20, por outros de modelo diverso, com tarifa de R$7,00, e que em conseqüência do elevado intervalo entre cada coletivo (mais de 30 minutos,) os mesmos vem circulando com superlotação.

Assevera, ainda, que tal conduta gera danos aos usuários da referida linha, como habitantes das áreas menos favorecidas deste município, que são transportados sem a devida segurança, além de lhes impor o desconhecimento acerca dos horários em que o coletivo estará na parada, violando os direitos do consumidor.

Requer, em sede de antecipação dos efeitos da tutela, que a Ré seja compelida a adequar o serviço para que o mesmo seja prestado com regularidade, sendo que os coletivos com tarifa mais econômica que servem a referida linha, deverão sair, com intervalo máximo de 15 (quinze) minutos; registrarem em escala própria, a regularidade de referidos intervalos, onde deve constar a numeração de cada coletivo, assim como o horário de saída e o nome completo do seu motorista; seja a tutela confirmada ao final; a condenação da empresa Ré ao pagamento de indenização por danos morais, bem como honorários ao Centro de Estudos Jurídicos do Ministério Público do Estado do Rio de janeiro.

Decisão de fls. 17 determinou a citação da parte Ré, indeferindo a antecipação dos efeitos da tutela pleiteados.

Citada, a Ré apresentou a Contestação de fls.25/37. Afirma que a linha 1132 é uma linha considerada ´Especial´, Poder Concedente; que o MP deixou de observar o Inquérito Civil PJDC nº 540/2008, por ele mesmo instaurado; que a referida linha tem valores tarifários distintos; que vem praticando preços inferiores aos autorizados na Tabela expedida no ano de 2001, pela Secretaria Municipal de Transportes, a fim de fazer confronto com os transportes alternativos (Vans e Kombis); que não procede a alegada onerosidade imposta ao consumidor e descumprimento dos horários dos intervalos das linhas, salientando que eventuais atrasos ocorrem em virtude dos congestionamentos de trânsito, especialmente nos horários de ´rush´. Por fim, pugnou pela improcedência do pedido, juntando os documentos de fls. 38/46.

Réplica às fls. 48/55.

Em provas, a parte Autora pugnou pelo julgamento antecipado da lide.

Por sua vez, a parte Ré manifestou interesse na produção da prova oral. Às fls.60 a Ré foi instada a esclarecer a pertinência da prova requerida. A parte Ré, às fls.64, informou que desiste da prova oral e requereu o julgamento antecipado da lide.

É O RELATÓRIO.

DECIDO.

Trata-se de Ação Civil Coletiva na qual a parte Autora pretende que a empresa Ré proceda a adequação do serviço prestado, devendo todos os coletivos da ré saírem do ponto final com intervalos máximos de 15 (quinze) minutos; registre em escala própria, a regularidade de referidos intervalos, onde deve constar a numeração de cada coletivo, assim como o horário de saída e o nome completo do seu motorista.

Não há preliminares a serem enfrentadas.

Vale ressaltar que, é desnecessária a intervenção do Município no presente feito eis que embora o serviço público prestado pela Ré seja realizado através de ato delegatário, a questão da prestação do serviço envolve, tão somente, as empresas e o consumidor. O Município vela pelo cumprimento de suas políticas programáticas, não justificando a qualidade de parte no presente feito em que se discute a relação entre prestadores de serviços e os consumidores.

Passa-se à análise do mérito da demanda.

Inicialmente cabe esclarecer que instada a se manifestar quanto às provas que pretendia produzir, a parte Ré desistiu da prova oral requerida. Embora a relação, objeto da demanda, seja de consumo, o ônus da prova incumbe a parte Autora quanto ao fato constitutivo de seu direito. Ao alegar que a ré não vem prestando serviço público eficiente e adequado, deve a parte autora comprovar tal fato, o que fez através do Inquérito Civil em apenso.

A empresa Ré tem o dever de prestar um serviço eficiente e adequado e possui a liberdade de escolher a forma como o fará. Porém, em hipótese alguma pode compelir o usuário a utilizar o veículo mais luxuoso, de tarifa mais cara, com a excessiva demora dos ônibus urbanos, que custam pouco mais da metade.

O fato da linha de ônibus ser considerada ´especial´ pelo poder concedente em nada modifica o constatado em sede de inquérito civil. Ou seja, que a ré opera a referida linha com 15 veículos, conforme determinação da Secretaria Municipal de transportes. Ocorre que, desses quinze, 10 são veículos rodoviários, cuja tarifa promocional é de sete reais e cinco são coletivos urbanos, onde o valor da passagem é de R$ 4,20. Tais fatos são informados pela própria ré, às fls. 13 e 14 do Inquérito Civil em apenso.

Ora, não é preciso ser engenheiro de trafego ou grande matemático para se perceber que se 2/3 da frota dão de ônibus especiais (passagem no valor promocional de R$ 7,00) e apenas 1/3 é de ônibus urbanos de tarifa mais econômica, o passageiro que deseja viajar pagando menos vai esperar mais que o razoável o ônibus mais barato. Além disso, TODOS os consumidores ouvidos em sede de inquérito civil reclamaram da demora dos veículos e da superlotação.

Por outro lado, a ré, contrariando o artigo 333, II, do CPC, não demonstrou que possui uma escala com a hora em que cada ônibus deveria sair, indicando se em determinada hora qual o tipo de ônibus (para que o consumidor tenha ciência da tarifa que será cobrada). Portanto, o usuário chega ao ponto em determinada hora e não possui previsão de qual o tipo de coletivo passará e em que horário.

Por fim, saliente-se que a desproporção entre os coletivos de passagem com o valor mais alto (2/3) e os de valor mais econômico (1/3) acaba por obrigar muitos passageiros que tem hora para chegar ao trabalho ou quaisquer outros compromissos a pegar o de valor mais alto, uma vez que, em menor número, os coletivos urbanos demoram mais que o razoável.

A alegação da ré de que a demora decorre da intensidade do tráfego, principalmente nos horários de pico, não é capaz de escusar a ausência de uma regularidade na saída dos coletivos, com horários pré determinados, através de uma tabela que informe ao passageiro o horário do ônibus e qual o modelo destinado para aquele horário.

Os engarrafamentos, cada vez mais extensos e comuns nesta cidade, podem justificar atrasos na hora do ´rush´, mais jamais falta de organização, de informação ao consumidor e má prestação do serviço público essencial. Desta forma, ficou comprovado nos autos ato ilícito perpetrado pela Ré, que deixou de prestar serviço público de forma adequada, segura e eficiente aos consumidores. Verifico, ainda que a demandada não presta informações satisfatórias a seus passageiros.

O Código de Defesa e Proteção ao Consumidor e a Lei nº 7.347/85 se completam e se interpenetram, aplicando-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais, no que for cabível, os dispositivos do Título III da Lei que institui o CDC, conforme dispõe o art. 21 da lei que disciplina a ação civil pública, acrescentado pelo art. 117 da norma consumerista.

A matéria em tela não se trata de uma nova espécie de direito material. Os direitos individuais homogêneos são, em verdade, os mesmos direitos comuns de que trata o disposto no art. 46, do CPC, cuja coletivização tem um sentido meramente instrumental, como estratégia para permitir sua mais efetiva tutela em juízo.

A Lei nº 7.347/85 prevê, em seu artigo 1º, a possibilidade de ação civil pública de responsabilidade por danos morais e materiais caudados ao consumidor, como no caso em tela. A ação civil pública deriva das class actions for damages do Direito Norte Americano, inseridas no Bill of Peace do séc. XVII e baseadas na equidade, pressupondo um número elevado de titulares de posições individuais de vantagem no plano substancial, possibilitando o tratamento processual unitário e simultâneo de todas elas, por intermédio da presença em juízo, de um único expoente da classe.

Como leciona Ada Pellegrini Grinover, em Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, comentado pelos autores do anteprojeto, Editora Forense, 1999, p.768/769: ´Na verdade, as ações coletivas em defesa de interesses individuais homogêneos não se limitam, no ordenamento brasileiro, à ação de responsabilidade civil por danos coletivamente causados (...) Objetivam tais ações a reparação, por processos coletivos, dos danos pessoalmente sofridos pelos consumidores, numa adaptação dos esquemas da class action, de idêntica destinação, às categorias do Direito Processual romano-germânico, com particular atenção às garantias do contraditório e da ampla defesa. Para tanto, o capítulo prevê regras de competência, estipula da intervenção sempre necessária do Ministério Público, contempla a ampla divulgação da demanda para facultar aos interessados a intervenção no processo e determina que a sentença, quando condenatória, seja genérica, limitando-se a fixar a responsabilidade do réu pelos danos causados. Caberá, depois, às vítimas ou seus herdeiros, numa verdadeira habilitação a título individual, proceder à liquidação da sentença (diretamente ou pelas entidades legitimadas), competindo-lhes também provar a existência do dano pessoalmente sofrido e seu montante, assim como a relação de causalidade entre este e o dano coletivo reconhecido pela sentença condenatória (...) Com efeito, a interpretação sistemática dos preceitos do art.1º do mencionado diploma legal revela a plausibilidade da pretensão do recorrente à condenação da recorrida ao pagamento de verba indenizatória em sede de ação civil pública. Hugo Nigro Mazilli, em A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo, Saraiva, 2003, p.131/132, in verbis: ´Originariamente, o objeto da LACP consistia na disciplina da ação civil pública da responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor e a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. Mas, como já anotamos a legislação subseqüente ampliou gradativamente o objeto da ação civil pública. Diante, porém, das inevitáveis discussões doutrinarias e jurisprudenciais sobre a ação civil pública da Lei nº 7.347//85 também alcançaria ou não os danos morais, o legislador resolveu explicitar a mens legis. A lei nº 8.8884/94 introduziu uma alteração na LACP, segundo a qual passou a ficar expresso que a ação civil pública objetiva a responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados a quaisquer dos valores transindividuais de que cuida a lei. São cumuláveis as indenizações por dano material e moral oriundos do mesmo fato- é o que dispõe a Súm.37, do Superior Tribunal de Justiça...´.

A presente hipótese não é a de defesa de direitos transindividuais, mas de direitos ou interesses individuais homogêneos, que são divisíveis e têm titulares individuais certos, em que a titulação particular de cada um deles possa ser comprovada. ´Assim, considerando que o patrimônio moral é pessoal e individual, não se pode negar que o direito à reparação tem a natureza de direito subjetivo individual, podendo, se for o caso, ser tutelado em demandas particulares. Por outro lado, em se tratando de lesão decorrente da mesma situação de fato e que atinge um número expressivo de pessoas, qualificam-se os direitos, vistos em seu conjunto, como individuais homogêneos, o que permite a sua tutela também por ação coletiva, em regime de substituição processual.´(Processo Coletivo: tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos, Teori. Albino Zavascki, 2ª Ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 2007, p.52).

Na hipótese, não vislumbro que os consumidores, de forma individual, tenham sofrido danos. O dano moral é a ofensa aos direitos personalíssimos, à dignidade da pessoa humana imposta injustamente a alguém.

Segundo a professora Maria Celina Bodin de Moraes, ´(...) afirmar que o dano moral é `dor, vexame, humilhação, ou constrangimento` é semelhante a dar-lhe o epíteto de `mal evidente`. Através destes vocábulos, não se conceitua juridicamente, apenas se descrevem sensações e emoções desagradáveis, que podem ser justificáveis, compreensíveis, razoáveis, moralmente legítimas até, mas que, se não forem decorrentes de `danos injustos`, ou melhor, de danos a situações merecedoras da tutela por parte do ordenamento, não são reparáveis. (...) Se a violação à situação jurídica subjetiva extrapatrimonial acarreta, ou não, um sentimento ruim, não é coisa que o Direito possa ou deva averiguar. O que o ordenamento jurídico pode (e deve) fazer é concretizar, ou densificar, a cláusula de proteção humana, não admitindo que violações à igualdade, à integridade psico-física, à liberdade e à solidariedade (social e familiar) permaneçam irressarcidas.´ (Danos à pessoa humana: uma leitura civil-constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, PP. 130-1) Por outro lado, entendo que houve violação do dever de informação e de prestar serviço público de forma adequada, eficiente e segura. Tais obrigações são de alto valor para a sociedade. Logo, de sua violação decorre o dano moral coletivo.

O dano moral coletivo existe porque a empresa Ré se omite da obrigação de prestar serviço de forma organizada e adequada, de modo a prestar informações claras para os passageiros sobre os horários e tipo de coletivo que sairá em determinado horário. Tais informações permitiriam ao consumidor se organizar para pegar o modelo (leia-se tarifa) de sua preferência em horário compatível, evitando-se, assim, a superlotação, esperas excessivas e o pagamento de tarifas mais altas do que a possibilidade do consumidor.

Tal fato não pode ser ignorado pelo Poder Judiciário que deve zelar pela observância do dever de informação nas relações de consumo. No caso concreto, o dano moral coletivo possui caráter pedagógico punitivo para que a empresa Ré não mais incida nas condutas acima descritas.

O dano moral coletivo, no entender da doutrina, uma nomenclatura equivocada para este instituto, não se confunde com o dano moral sofrido por cada consumidor. O caráter punitivo repressivo do presente instituto, visa resguardar o interesse social, que está agregado ao direitos difusos e coletivos.

Desta forma, tenho por configurado o dano moral coletivo, posto que a Ré violou direito transindividual de ordem coletiva, infringindo normas de ordem pública que regem as relações de consumo.

É devida a indenização por dano moral coletivo, pois tal atitude da Ré abala o sentimento de dignidade, falta de apreço e consideração aos consumidores, tendo reflexos na coletividade.

Isto posto, JULGO PROCEDENTE, em parte, o pedido para condenar a ré a:

1) prestar serviço público de transporte coletivo, com regularidade, obedecendo a saída de todos os coletivos que servem à linha 1132, a intervalos de quinze minutos, efetuando, ainda , em escala própria, a regularidade dos intervalos, devendo constar do registro a numeração de cada coletivo, horário de saída e nome completo do motorista;

2) ao pagamento correspondente a R$ 70.000,00 (setenta mil reais), na forma do artigo 13 da Lei 7.347/85, a título de dano moral coletivo;

3) julgo improcedente o item ´c´ do pedido.

Diante da sucumbência de maior parte do pedido, condeno a empresa Ré, ainda, ao pagamento das custas judiciais e honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor da condenação, que serão revertidos ao Centro de Estudos Jurídicos do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro.

Dê-se ciência ao MP.

P.R.I.

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