Muitos consumidores vêm sendo surpreendidos pelos bancos. Em vez de cartas de cobrança, estão recebendo em casa avisos de devolução de recursos. A surpresa foi proporcionada pelo Banco Central, que exigiu o ressarcimento aos que pagaram, ao longo de anos, por serviços que não podiam ser tarifados. São os casos dos boletos ou carnês. Tradicionalmente, as instituições cobravam por folha emitida algo entre R$ 3 e R$ 5. Mas o BC entendeu que o pagamento do serviço deveria ser honrado pelos emissores do documento de cobrança: bancos, lojas e concessionários de veículos. A exceção está no financiamento da casa própria, de longa duração, considerado um serviço especial e, por isso, pode ser cobrado. Os valores devolvidos são corrigidos pelo Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M).
Apesar da boa vontade demonstrada pelos bancos, os consumidores devem ficar atentos e exigirem o que lhes é devido. Muita gente sequer sabe que pagou pelos boletos, pois, devido ao baixo custo, os valores passavam despercebido. A proibição desse tipo de cobrança só foi definida em março de 2009, mais de um ano depois de o Conselho Monetário Nacional (CMN) ter baixado a Resolução 3.518, que padronizou as tarifas bancárias e estabeleceu a gratuidade para diversos serviços, pondo fim aos abusos cometidos pelos bancos. “Boleto bancário não faz parte do serviço e não pode ser atribuído ao cliente”, argumentou Daniela Correa, defensora pública federal.
Litígio desgastante
Além do boleto, não podem ser cobrados taxa de abertura de crédito, cheques compensados, tarifas incidentes sobre contas sem saldo e tarifa de liquidação antecipada de financiamentos, por desrespeitarem o Código de Defesa do Consumidor (CDC), em vigor desde 1991. Mas a tarifa de liquidação antecipada, proibida para as operações contratadas a partir de dezembro de 2007, ainda é objeto de litígio entre clientes e instituições financeiras, que alegam perdas de receitas futuras.
Felizmente, os tribunais estão dando ganho de causa aos correntistas. Os clientes do Itaú Unibanco que, de 2002 para cá, pagaram tarifas para antecipar a liquidação de financiamento de carro, crédito pessoal e consignado terão direito a rever o dinheiro de volta com base em uma decisão judicial obtida pelo Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec). O banco está recorrendo da decisão.
Segundo o presidente do Ibedec, antes da proibição, a quitação antecipada de dívidas não tinha vantagens, pois era punida com taxas altíssimas. “Essa cobrança era ilegal”, afirmou Geraldo Tardin, presidente do Ibedec. Ele ressaltou ainda que o Artigo 52, parágrafo 2º, do Código de Defesa do Consumidor, obriga o abatimento dos juros embutidos nas prestações pagas antes do prazo. Ou seja, além da tarifa por quitação antecipada, os bancos também devem devolver os juros que não foram abatidos dos financiamentos. Para ele, é importante que as pessoas exijam a devolução imediata e guardem os contratos que se relacionem a consumo pelo prazo de cinco anos. “A falta dos documentos tem sido nosso maior problema para exigir o dinheiro de volta”, lamentou.
Violação de direitos
Na opinião de defensora federal Daniela Correa, apesar da demora, finalmente os abusos cometidos pelos bancos começam a ser corrigidos tanto pela Justiça quanto pelo BC. A seu ver, há alguns anos, seria quase impossível — mesmo quando indevido — ver um banco restituir dinheiro cobrado do cliente por uma taxa irregular. “A política sistemática de violação dos direitos do consumidor é lucrativa”, disse. A Justiça é morosa e só agora o cidadão começa a entender como ela funciona. “Tudo isso levou tempo. Nesse período, os bancos sentiram que valia a pena manter o que os favorecia”, acrescentou.
Não é à toa que os bancos dificultam ao máximo a correção de abusos. Pesquisa da Consultoria Austin Rating mostra que as tarifas se tornaram uma importante fonte de renda para o sistema financeiro. Apenas os 35 bancos que divulgaram balanços neste ano embolsaram receitas de R$ 132,5 bilhões. Deste total, 24,8% se referem a tarifas. “A tendência é de continuar nesse ritmo, porque ainda há uma parcela muito grande de população não bancarizada, que entrará no sistema”, disse Alex Agostini, economista-chefe da empresa.
Para Luís Miguel Santacreu, analista de instituições financeiras da Austin Rating, “não havia uma relação de igualdade entre os bancos e os consumidores”. Na sua opinião, nos últimos anos, os bancos têm tentado compensar, com tarifas, as perdas de receitas com a queda da inflação.
STJ decide sobre poupança
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgará, no próximo dia 25 de agosto, um recurso especial que poderá alterar um entendimento da própria casa e, consequentemente, mudar o rumo sobre todas as ações que tramitam no Judiciário com pedido de ressarcimento por perdas nas cadernetas de poupança relativas aos planos econômicos nas décadas de 1980 e 1990: Bresser (1987), Verão (1989), Collor I (1990) e Collor 2 (1991). Além de definir os índices de correção a serem adotados, o STJ decidirá também se o prazo para entrar com ações coletivas sobre os chamados expurgos inflacionários continua sendo de 20 anos ou será reduzido para cinco anos.
Isso porque, em abril, a Segunda Seção do STJ decidiu que o prazo para ajuizar uma ação civil pública no caso dos planos Bresser e Verão era de cinco anos. O entendimento tomou como base a Lei de Ação Popular e não a Lei de Ação Civil Pública, que não estabelece um prazo específico para tal questão. Como grande parte das ações civis públicas foram ajuizadas ao fim do período de 20 anos a contar da data de início de cada plano, caso o STJ adote esse posicionamento, milhares de consumidores que se sentiram lesados pelas alterações nos cálculos de correção dos saldos de poupança perderão o direito ao ressarcimento.
Ontem, as partes interessadas — representantes dos bancos, de entidades de defesa do consumidor e da Defensoria Pública da União — reuniram-se com o ministro relator do recurso, Sidnei Beneti. “Esse julgamento é muito importante porque essa decisão será tomada como base para todos os outros tribunais do país”, preocupa-se a gerente jurídica do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Maria Elisa Novais. Para a reunião, o Idec preparou um levantamento preliminar que aponta 127 acórdãos julgados pelos STJ, desde a década de 1990, sobre prescrição das ações de planos econômicos, todas com decisão firme sobre o prazo de 20 anos.
Para o secretário geral do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon), Walter Moura, a Lei de Ação Popular não se aplica a essa questão. “Ela deve ser usada pelos cidadãos que querem anular atos administrativos que levam ao enriquecimento ilícito ou estão relacionados com improbidade administrativa. A lei de tutela coletiva dos consumidores é regida pelo Código de Defesa do Consumidor e pelo Código Civil”, defende. “Isso abre um grave precede que, se aprovado, poderá afetar diferentes direitos difusos dos consumidores em futuras ações civis públicas”, alerta do defensor público federal Edson Rodrigues Marques. A Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) saiu satisfeita da reunião e considerou a prescrição um assunto superado. (NQ)
Apesar da boa vontade demonstrada pelos bancos, os consumidores devem ficar atentos e exigirem o que lhes é devido. Muita gente sequer sabe que pagou pelos boletos, pois, devido ao baixo custo, os valores passavam despercebido. A proibição desse tipo de cobrança só foi definida em março de 2009, mais de um ano depois de o Conselho Monetário Nacional (CMN) ter baixado a Resolução 3.518, que padronizou as tarifas bancárias e estabeleceu a gratuidade para diversos serviços, pondo fim aos abusos cometidos pelos bancos. “Boleto bancário não faz parte do serviço e não pode ser atribuído ao cliente”, argumentou Daniela Correa, defensora pública federal.
Litígio desgastante
Além do boleto, não podem ser cobrados taxa de abertura de crédito, cheques compensados, tarifas incidentes sobre contas sem saldo e tarifa de liquidação antecipada de financiamentos, por desrespeitarem o Código de Defesa do Consumidor (CDC), em vigor desde 1991. Mas a tarifa de liquidação antecipada, proibida para as operações contratadas a partir de dezembro de 2007, ainda é objeto de litígio entre clientes e instituições financeiras, que alegam perdas de receitas futuras.
Felizmente, os tribunais estão dando ganho de causa aos correntistas. Os clientes do Itaú Unibanco que, de 2002 para cá, pagaram tarifas para antecipar a liquidação de financiamento de carro, crédito pessoal e consignado terão direito a rever o dinheiro de volta com base em uma decisão judicial obtida pelo Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec). O banco está recorrendo da decisão.
Segundo o presidente do Ibedec, antes da proibição, a quitação antecipada de dívidas não tinha vantagens, pois era punida com taxas altíssimas. “Essa cobrança era ilegal”, afirmou Geraldo Tardin, presidente do Ibedec. Ele ressaltou ainda que o Artigo 52, parágrafo 2º, do Código de Defesa do Consumidor, obriga o abatimento dos juros embutidos nas prestações pagas antes do prazo. Ou seja, além da tarifa por quitação antecipada, os bancos também devem devolver os juros que não foram abatidos dos financiamentos. Para ele, é importante que as pessoas exijam a devolução imediata e guardem os contratos que se relacionem a consumo pelo prazo de cinco anos. “A falta dos documentos tem sido nosso maior problema para exigir o dinheiro de volta”, lamentou.
Violação de direitos
Na opinião de defensora federal Daniela Correa, apesar da demora, finalmente os abusos cometidos pelos bancos começam a ser corrigidos tanto pela Justiça quanto pelo BC. A seu ver, há alguns anos, seria quase impossível — mesmo quando indevido — ver um banco restituir dinheiro cobrado do cliente por uma taxa irregular. “A política sistemática de violação dos direitos do consumidor é lucrativa”, disse. A Justiça é morosa e só agora o cidadão começa a entender como ela funciona. “Tudo isso levou tempo. Nesse período, os bancos sentiram que valia a pena manter o que os favorecia”, acrescentou.
Não é à toa que os bancos dificultam ao máximo a correção de abusos. Pesquisa da Consultoria Austin Rating mostra que as tarifas se tornaram uma importante fonte de renda para o sistema financeiro. Apenas os 35 bancos que divulgaram balanços neste ano embolsaram receitas de R$ 132,5 bilhões. Deste total, 24,8% se referem a tarifas. “A tendência é de continuar nesse ritmo, porque ainda há uma parcela muito grande de população não bancarizada, que entrará no sistema”, disse Alex Agostini, economista-chefe da empresa.
Para Luís Miguel Santacreu, analista de instituições financeiras da Austin Rating, “não havia uma relação de igualdade entre os bancos e os consumidores”. Na sua opinião, nos últimos anos, os bancos têm tentado compensar, com tarifas, as perdas de receitas com a queda da inflação.
STJ decide sobre poupança
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgará, no próximo dia 25 de agosto, um recurso especial que poderá alterar um entendimento da própria casa e, consequentemente, mudar o rumo sobre todas as ações que tramitam no Judiciário com pedido de ressarcimento por perdas nas cadernetas de poupança relativas aos planos econômicos nas décadas de 1980 e 1990: Bresser (1987), Verão (1989), Collor I (1990) e Collor 2 (1991). Além de definir os índices de correção a serem adotados, o STJ decidirá também se o prazo para entrar com ações coletivas sobre os chamados expurgos inflacionários continua sendo de 20 anos ou será reduzido para cinco anos.
Isso porque, em abril, a Segunda Seção do STJ decidiu que o prazo para ajuizar uma ação civil pública no caso dos planos Bresser e Verão era de cinco anos. O entendimento tomou como base a Lei de Ação Popular e não a Lei de Ação Civil Pública, que não estabelece um prazo específico para tal questão. Como grande parte das ações civis públicas foram ajuizadas ao fim do período de 20 anos a contar da data de início de cada plano, caso o STJ adote esse posicionamento, milhares de consumidores que se sentiram lesados pelas alterações nos cálculos de correção dos saldos de poupança perderão o direito ao ressarcimento.
Ontem, as partes interessadas — representantes dos bancos, de entidades de defesa do consumidor e da Defensoria Pública da União — reuniram-se com o ministro relator do recurso, Sidnei Beneti. “Esse julgamento é muito importante porque essa decisão será tomada como base para todos os outros tribunais do país”, preocupa-se a gerente jurídica do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Maria Elisa Novais. Para a reunião, o Idec preparou um levantamento preliminar que aponta 127 acórdãos julgados pelos STJ, desde a década de 1990, sobre prescrição das ações de planos econômicos, todas com decisão firme sobre o prazo de 20 anos.
Para o secretário geral do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon), Walter Moura, a Lei de Ação Popular não se aplica a essa questão. “Ela deve ser usada pelos cidadãos que querem anular atos administrativos que levam ao enriquecimento ilícito ou estão relacionados com improbidade administrativa. A lei de tutela coletiva dos consumidores é regida pelo Código de Defesa do Consumidor e pelo Código Civil”, defende. “Isso abre um grave precede que, se aprovado, poderá afetar diferentes direitos difusos dos consumidores em futuras ações civis públicas”, alerta do defensor público federal Edson Rodrigues Marques. A Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) saiu satisfeita da reunião e considerou a prescrição um assunto superado. (NQ)
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